Cela aberta
ORA ET LABORA
terça-feira, 27 de dezembro de 2011
O Verbo está entre nós...
Votos de Feliz Natal e uma Esperança renovada para 2012.
sábado, 23 de abril de 2011
Santa Páscoa
terça-feira, 15 de março de 2011
Exposição de Pintura
sexta-feira, 1 de outubro de 2010
O Abade
O Abade digno de presidir ao mosteiro, deve lembrar-se sempre daquilo que é chamado, e corresponder pelas acções ao nome de superior. Com efeito, crê-se que, no mosteiro ele faz as vezes do Cristo, pois é chamado pelo mesmo cognome que Este, no dizer do Apóstolo: "Recebestes o espírito de adopção de filhos, no qual clamamos: ABBA, Pai. " Por isso o Abade nada deve ensinar, determinar ou ordenar, que seja contrário ao preceito do Senhor, mas que a sua ordem e ensinamento, como o fermento da divina justiça se espalhe na mente dos discípulos; lembre-se sempre o abade de que da sua doutrina e da obediência dos discípulos, de ambas essas coisas, será feita apreciação no tremendo juízo de Deus.
...Quando alguém recebe o nome de Abade, deve presidir a seus discípulos usando de uma dupla doutrina, isto é, apresente as coisas boas e santas, mais por acções do que por palavras, de modo que aos discípulos capazes de entendê-las proponha os mandamentos do Senhor por meio de palavras, e aos duros de coração e aos mais simples mostre os preceitos divinos pelas próprias acções. Assim, tudo quanto ensinar aos discípulos como sendo nocivo, indique pela sua maneira de agir que não se deve praticar, a fim de que. pregando aos outros, não se torne ele próprio réprobo, e Deus não lhe diga um dia como a um pecador: "Por que narras as minhas leis e anuncias o meu testamento pela tua boca? tu que odiaste a disciplina e atiraste para trás de ti as minhas palavras", e ainda: "Vias o argueiro no olho de teu irmão e não viste a trave no teu próprio".
Antes de tudo, que não trate com mais solicitude das coisas transitórias, terrenas e caducas, negligenciando ou tendo em pouco a salvação das almas que lhe foram confiadas, mas pense sempre que recebeu almas a dirigir, das quais deverá também prestar contas. E para que não venha, porventura, a alegar falta de recursos, lembrar-se-á do que esta escrito: "Buscai primeiro o reino de Deus e a sua justiça, e todas as coisas vos serão dadas por acréscimo"; e ainda: "Nada falta aos que O temem". E saiba que quem recebeu almas a dirigir, deve preparar-se para prestar contas. Saiba como certo que de todo o número de irmãos que tiver sob seu cuidado, no dia do juízo, deverá prestar contas ao Senhor das almas de todos eles, e mais, sem dúvida também da sua própria alma. E assim, temendo sempre a futura apreciação do pastor acerca das ovelhas que lhe foram confiadas enquanto cuida das contas alheias, torna-se solícito para com a suas próprias, e enquanto com suas exortações subministra a emenda aos outros, consegue ele próprio emendar-se de seu vícios.
(Cf. Regra de S. Bento, cap. II)
Para S. Bento a vida monástica cenobítica assenta em três pilares fundamentais: Comunidade, Regra e Abade. A Regra é o código que possibilita a vivência harmoniosa da comunidade monástica, onde tudo tem uma certa ordem; O Abade nasce da fraternidade para testemunhar, em primeiro lugar, o amor de Deus, e praticá-lo zelando por todos os irmãos que compõem a comunidade. A Comunidade é o lugar onde Deus estabelece a sua morada.
Em seguida apresento um comentário que um monge de Cluny do séc. IX escreveu a propósito do capítulo II da Regra de S. Bento.
"No Abade devemo-nos aperceber da sua misericórdia, da amizade, da piedade e da modéstia. É preciso que ele seja benevolente para com os monges doentes, que socorra os faltosos, afável com os seus irmãos, consolador dos aflitos, conforto dos trabalhadores, que ajude os bem intencionados, encoraje os zelosos, reanime os cansados, apoie os que hesitam e eleve os que sucumbiram. Amará todos os seus irmãos do mesmo modo, não perseguirá nenhum com a sua raiva, nem ignorará zelo nenhum. Calmo e sem agitação, sem obstinação no seu julgamento ou nos seus conselhos; mostrará a todos uma face radiosa e um carácter alegre, discreto e prático. Quando encontrar algum motivo de descontentamento em algum dos seus irmãos evitará medidas prematuras e tirânicas, mas tentará corrigi-lo com a ajuda do seu espírito misericordioso, em vez de o desencorajar numa perpétua desconfiança ou numa contínua repressão." (Cf. Guy de Valous - Le monachisme clunisien)
quinta-feira, 20 de maio de 2010
Espírito e organização de um mosteiro beneditino:
PAX
O mosteiro, que é concebido pela Regra dos Monges (mais conhecida como Regra de S. Bento), tem o carácter de uma família, fortalecida pelo voto particular da estabilidade. O pai, mestre e cabeça não é o abade, de quem dependem todos os monges, envolvidos em vários ofícios; mas o próprio abade está sujeito à regra, da qual é discípulo e, em certa medida, intérprete. O tratamento das matérias e dos assuntos temporais, sempre sob a sua vigilância, é confiada ao celeireiro ou tesoureiro. Outros oficiais são designados: para a hospedaria, enfermaria, portaria, a formação de noviços, etc.
Cada candidato à vida monástica atravessa um ano de estágio (a que chamamos postulantado); e se depois de madura e livre ponderação escolher este estado de vida, e a comunidade o consentir, é acolhido no seio da família monástica, onde vai encontrar as condições necessárias para um caminho de união com Deus, no tempo e na eternidade. No mosteiro, muito bem apelidado "casa de Deus" (RB 31,19), tudo deve fluir em determinada ordem: cada um tem o seu lugar bem definido, tudo deve estar no seu tempo e lugar, para que ninguém nesta casa, seja incomodado ou entristecido e para que "todos os membros estejam em paz"(RB 34,5).
A vida comunitária desenvolve-se numa alternância sábia e pacífica entre oração litúrgica e particular, de trabalho intelectual e manual. O programa é, com sucesso, sintetizado, por volta do séc. X, no lema "ora et labora": reza e trabalha.
É geralmente reconhecida a contribuição característica dos discípulos de S. Bento para o culto litúrgico, que sempre procuraram guardar com especial esplendor e dignidade, bem como os estudos, a valorização da agricultura, as artes plásticas e os trabalhos manuais. Mas todo o ordenamento disposto pela regra, como é óbvio, tem como objectivo treinar os monges para a santidade. Na vida de fé e humildade, reconhecem que o abade está agindo no lugar de Cristo. Daí a fundamental e alegre virtude da obediência. Para seguir a Cristo, eles são libertados das preocupações dos bens terrenos, através da pobreza, e consagram-se totalmente ao amor de Deus pela castidade, enquanto na comunhão de vida com os irmãos aproveitam, em cada momento, as ocasiões para fazer florescer a caridade.
Tudo isto S. Bento o ensina e dispõe com sabedoria romana e amor cristão. Se condena o defeito e a desordem e os corrige severamente, seguindo os sistemas rígidos de então, por outro lado sabe compadecer-se das fraquezas do espírito e das enfermidades físicas; incita à ascensão generosa das virtudes, mas também considera a fragilidade da natureza humana; exige o que é necessário para a perfeição, principalmente nas disposições interiores, mas indulta no acessório, especialmente no consumo de alimentos, bebidas, roupas; exige obediência absoluta e pronta, mas tem em conta as dificuldades que esta pode encontrar; odeia a murmuração, mas recomenda que o abade não dê motivo para tal com pedidos excessivos.
Estes e outros aspectos demonstram aquela notável virtude da discrição que o mesmo S. Gregorio Magno assinala como característica da nossa Regra, definindo-a como "discretione praecipuam": admirável pela discrição, que S. Bento chama de "mãe das virtudes". Como é evidente, muitas das prescrições sobre a prática e a disciplina do mosteiro referem-se a costumes, leis, enfim… ao "habitat" do século VI, e o leitor hodierno deverá considerar que a evolução dos tempos, o desenvolvimento da educação privada e social, a legislação eclesiástica e civil, e outros factores têm contribuído para alterar ou apagar muitos detalhes da vida organizada: coisas como o sistema de dormitório, lavar os pés aos hóspedes, a punição com castigos corporais ou com a excomunhão regular, a admissão das crianças aos votos monásticos, etc. são os traços caducos e, por isso, reformáveis de toda a legislação e não é nenhuma surpresa que, depois de quinze séculos, realmente tenham caído ou mudado para se adaptar às condições do ambiente histórico.
O que continua a ser vital, e, sobretudo nos nossos dias, válido, é o espírito, a directriz, o substrato substancial que determinou a estrutura da Regra: e isso permanece tão sólido, abrangente, racional e equilibrado, que o grande Bossuet, nas suas Oeuvres oratoires, não hesitou em dizer: "Nesta Regra beneditina a prudência une-se à simplicidade, a humildade cristã associa-se à coragem generosa, a doçura tempera a severidade e a santa liberdade enobrece a necessária obediência. Nessa, a correcção mantém o seu vigor, mas a indulgência e a bondade a adornam com suavidade; os preceitos conservam toda a sua firmeza, mas a obediência dá repouso ao espírito e paz às almas; o silêncio impõe-se pela sua gravidade, mas a conversação deixa-se embelezar por uma amável graça; e, finalmente, o exercício da autoridade não é desprovido de força, mas a fraqueza não carece de apoio"(ed. J. Lebarq, Paris, 1921, IV, p. 630). Não é de admirar que a fusão feliz da sabedoria humana e sobrenatural tenha produzido durante muitos séculos e até hoje os mais felizes frutos de cultura, de ciência, de arte, de progresso civilizacional e, sobretudo, de santidade.
A regra que S. Bento diz ser "para principiantes" (RB 73,8) tem gerado fileiras densas de santos para os dias de hoje: basta pensar no grande Agostinho de Cantuária, Beda, Bonifácio, Hugo, Pedro Damião, Anselmo, Estevão Harding, Bernardo, Gertrudes, Matilda, Hildegarda, Gregório VII e, mais recentemente, os bem-aventurados Columba Marmion, Plácido Riccardi, Fortunata Viti, os cardeais Dusmet e Schuster etc.
Um monge
UIOGD
segunda-feira, 17 de maio de 2010
"Convertei-vos e acreditai no Evangelho"
PAX
Na sua visita apostólica aos cristãos católicos em Portugal, o Papa Bento XVI escreveu no Livro de Honra do Santuário de Fátima estas palavras: "Convertei-vos e acreditai no Evangelho" (Mc 1, 15). Estas palavras, proferidas por Jesus logo no início do seu ministério na Galileia, não pretendiam infundir o temor, nem desencorajar aqueles que o ouviam, mas levar alento e uma "melodia" de esperança a um mundo cravejado de injustiças e misérias humanas.
Como nos tempos de Jesus, coexistem hoje bem perto de nós (e, talvez, dentro de nós), situações de «não-vida» e de «não-dignidade» humana autêntica; e tal como nos tempos de Jesus, necessitamos de palavras de estímulo e de esperança para consolar os tristes e dar alento aos que choram.
Ao acedermos ao convite de Jesus sabemos que estamos a encontrar a Verdade, e, no entanto, ainda só estamos no início do caminho para ir ao seu encontro. O que Jesus nos pede é isso mesmo: que colaboremos com a Verdade para que, assim, façamos parte dela. E o que é a Verdade, senão o Amor que Ele derramou na Cruz, e do qual, espera, sejamos nós, agora, os transmissores? Caritas et Veritas (caridade e verdade) são, portanto, duas faces de uma mesma moeda, as quais constituem o ponto de partida do ministério de Pedro, sempre em analogia com o ministério de Jesus.
Obrigado, Santo Padre, pela feliz esperança que infundistes nos corações dos vossos irmãos, em Portugal!
UIOGD
quarta-feira, 28 de abril de 2010
Pão da Vida...
quarta-feira, 21 de abril de 2010
Monaquismo: caminho para unir os povos da Europa?
Por Paolo Tanduo
MILÃO, terça-feira, 20 de abril de 2010
Em 18 de Março passado foi realizado em Milão um encontro com o vice-director do TG5 Andrea Pamparana, organizado pelo Centro Cultural Católico São Bento e pelo Comité Soci Coop Baggio. Partindo da trilogia Bento – Bernardo – Abelardo do monaquismo, discutimos o tema “O monaquismo: caminho para unir os povos da Europa?”.
Hoje, mais do que nunca, precisamos de monges, de verdadeiros beneditinos, de verdadeiros cistercienses e, porque não, de autênticos cartuxos, ainda que estes pareçam um tanto anacrónicos por não se ocuparem directamente de assuntos sociais. Assim, Andrea Pamparana deu início à sua conferência. São Bento desempenhou um papel fundamental na história do Ocidente e da Europa. Não foi apenas um gigante da fé, o fundador do monaquismo ocidental, mas também o precursor de um colossal projecto cultural. Sob a sua liderança, milhares de monges espalhados por toda a Europa salvaram a economia e os livros, o saber dos antigos, a filosofia de Platão e Aristóteles. Estes preservaram os elementos fundamentais da civilização greco-romana. Por tais homens letrados é que se transfundiram no rio da cultura antiga as novas forças representadas pela compreensão bíblico-cristã da essência humana. Os monges recolheram aquela herança, enriquecendo-a e divulgando-a. Esta fusão entre Jerusalém, Atenas e Roma foi o acto constitutivo do que hoje chamamos de Europa.
Hoje há uma renovada sede de Deus e de autenticidade. Peço aos meus amigos da Igreja, disse Pamparana, que me falem de Deus, porque Deus é um mistério. Há tantas pessoas que se questionam sobre a morte, sobre a vida e sobre Deus. Pamparana lembrou alguns episódios de sua vida ligados à figura de João Paulo II, de como este representou, com seu testemunho particular no momento de sofrimento decorrente de sua doença, algo de extraordinário que ficará na história, não apenas dos cristãos.
Assim como João Paulo II, também Bento, Bernardo e Abelardo representam algo que vale não apenas para os cristãos ou para aqueles que crêem em Deus, mas para o homem, para a pessoa, para a colectividade; são património de todos nós. O artigo 1º da regra beneditina é “Escuta, ó filho, as Palavras do Mestre”. Esta regra é fundamental numa sociedade como a nossa, onde, cada vez mais, a palavra “escutar” perde significado. A postura de Bento está profundamente ligada à concepção que tinha de sua própria missão. São Bento não pensava: “Agora salvarei o mundo de uma era de ferocidade sem precedentes”.
Os monges beneditinos implementaram as reformas de todo o sistema agrário, recuperaram áreas de cultivo degradadas, reconstituíram a economia europeia; a sua contribuição foi decisiva nos mais diversos campos. Basta lembrar que foi um monge quem desenvolveu a notação musical baseada no pentagrama, num mosteiro de Pomposa. Estas actividades tinham como única finalidade a salvação da humanidade.
São Bento buscava tão somente servir a Deus, conforme lembrou Bento XVI em seu discurso no Colégio dos Bernardinos em Paris em 2008: “na busca por Deus, tornam-se importantes as ciências seculares, que nos indicam um caminho através da linguagem. Pois a busca por Deus exigia a cultura da palavra, é parte integrante de todo mosteiro a biblioteca, que indica os caminhos por meio das palavras. Desta exigência intrínseca de se falar com Deus e de cantá-lo com as palavras por Ele doadas é que nasceu a música ocidental”.
Bento explica a seus monges que é com Jesus que a história muda. O conceito que temos de democracia nasceu em Atenas, mas a democracia ateniense não era para todos, não era de massa e sim para poucos, pois, no mundo antigo, havia os homens, que não trabalhavam, e havia os escravos. Jesus é novidade pela qual os homens passam a ser todos iguais. Será São Bento o responsável por levar esta ideia adiante. Ele nos mostra hoje que o homem, para estar de pé, necessita de duas dimensões: ora et labora, contemplação e acção. É com a sua Regra que se expande o sentimento e o desejo de servir a Deus, que passa a ser então a ligação fundamental entre a cultura ocidental e a redescoberta da cultura grega. Bento, escreve Pamparana no seu livro, indicava a seus discípulos as duas estradas do monaquismo: a primeira estrada diz respeito ao interior do homem, pois ser monge exige que congregue todas as forças e faculdades numa atenção e numa obediência exclusivas a Deus; a outra, é ser monge para o próximo.
São Bernardo quis que o monge, até então isolado na clausura, se pusesse a pregar; poucas pessoas percorreram tantos quilómetros como ele. Os Papas sempre necessitaram de Bernardo para resolver também problemas de natureza política – suas cartas são obras-primas de estratégia política. Quando Bernardo chega a Roma, o Papa Inocêncio, que era um monge, levanta-se para ir ao seu encontro, e chega a esboçar a intenção de inclinar-se; os cardeais presentes ficaram chocados; como poderia ser possível? o Papa ia ao encontro de Bernardo, e não o contrário.
Vem-me à mente a imagem de João Paulo II que, ao se tornar Papa, recebe os cardeais para as saudações, e quando chega a vez do cardeal Wyszyński, o impede de se ajoelhar, por considerá-lo como um pai, a quem deveria prestar homenagem. O mesmo ocorreu no encontro do Papa Inocêncio com Bernardo. Bernardo era um gigante, poderia ter sido Papa, rei ou imperador, disse Pamparana. Era de tal modo estimado que o rei da França o chamou para administrar as suas terras.
Bernardo chega a Milão vindo da Alemanha, onde esteve para repreender duramente um monge que havia acusado os judeus de deicídio, desencadeando assim um verdadeiro massacre. Bernardo considerava os judeus como irmãos mais velhos, e, por isso gozava de grande estima entre eles. Em Milão, a sua popularidade leva o povo a pedir que seja nomeado cardeal-arcebispo. Mas Bernardo não se interessa, desejando apenas voltar o mais rápido possível ao seu mosteiro para junto dos seus irmãos monges.
Os seus sermões importantíssimos, em particular os comentários do Cântico dos Cânticos, foram registados por seus monges, bem como as suas numerosas epístolas, cujo método de catalogação é ainda hoje estudado. Os milaneses presentearam Bernardo com um candelabro, uma obra-prima em ouro maciço ainda hoje conservada no Domo de Milão, na tentativa de convencê-lo; mas ele recusou. Sim, a clausura e a estrada: nenhum outro título seria mais adequado para descrever a história de São Bernardo. Uma história na qual o mistério da vida na clausura não conduz a um afastamento das angústias da existência, mas, ao contrário, nelas nos mergulha.
Por ocasião da morte de Gerardo, o seu irmão mais próximo, os outros monges o vêem a chorar e se perguntam: como aquele que sempre nos ensinou que a morte é a libertação que nos permite ir ao encontro de Deus pode agora chorar? E Bernardo responde de maneira genial; é um homem e chora pela morte de seu amigo, mas precisa resolver o problema educativo na sua relação com seus monges, e diz: “choro de alegria e de inveja deste que finalmente está junto de Nosso Pai”. Bernardo esconde uma coisa que é maravilhosa: a fraqueza dos homens.
Em Bernardo emerge a vivacidade inteligente e actuante da cultura religiosa medieval. Uma cultura na qual fé e vida se entrelaçam, na qual o santo era um homem mais capaz de humanidade, mais agudo ao olhar para o mundo e para os problemas da sociedade.
O movimento beneditino cresce e se torna importantíssimo também no plano económico e político, como acontece na abadia de Cluny. Os beneditinos tornam-se poderosos. Esta riqueza incomoda os jovens que buscavam viver a essência da regra beneditina. Nasce a reforma Cistercense. Bernardo se une a eles, e é redigida a carta da caridade, primeiro exemplo de carta constitucional de unidade da Europa.
Constitui-se uma vasta rede de mosteiros, e os monges já não eram franceses, alemães ou espanhóis: eram apenas monges. Mas como se comunicavam? Simples: havia o latim. Bernardo, com seus confrades, começa a construir mosteiros por toda a Europa. Também os cistercenses começam a acumular grandes riquezas – com o risco de perder de vista a essência da mensagem cristã, que coloca a pessoa no centro de tudo.
Neste período, os movimentos beneditino e cistercense encontram o movimento franciscano, que convoca novamente à pobreza e à proximidade dos mais pobres. Nascem, no movimento monástico, os Bancos do Santo Espírito e os Monti di Pietà (instituições financeiras sem fins lucrativos, voltadas ao crédito agrícola e aquilo que hoje apelidamos de microcrédito), com a possibilidade de apoiar os necessitados e dar aos pequenos empreendedores o que lhes fosse necessário: nasce assim a economia moderna.
Hoje, a nossa cultura tenta renegar as suas origens, com consequências devastadoras. A nossa cultura tem raízes profundas nas ideias de igualdade entre todos os homens, de igualdade entre homens e mulheres, do trabalho como algo que enobrece o homem, de liberdade. Pamaprana ilustrou essa verdade com um episódio do Evangelho: certa vez, um grupo de homens condenou à morte uma mulher adúltera; se fosse o contrário, o homem adúltero não seria condenado. Mas chega Jesus e diz: “que atire a primeira pedra aquele que não tiver pecado”.
Jesus restabelece a igualdade entre todos os homens e também entre o homem e a mulher. Ensina-nos a amar o nosso próximo. Tais elementos não estão presentes em outras culturas; são próprios da nossa.
O carisma de Bernardo era tal que, conta-se, as esposas trancavam os maridos dentro de suas casas quando este passava, para evitar que eles o seguissem.
A nossa cultura conta, seguramente, também com Abelardo entre seus principais protagonistas. Este dizia a seus jovens: “para que possam crer, devem compreender, devem conhecer, devem saber”. Com Abelardo, muda-se definitivamente a história da educação, muda a concepção do estudo, nasce a universidade tal qual a conhecemos hoje. A influência de Abelardo foi imensa.
O final do século XII – erroneamente definido como uma época obscura, mas que na verdade viu brilhar uma formidável luz – deve a ele o gosto pelo rigor técnico e uma capacidade extraordinária de explicar e se fazer entender. Milhares de jovens de toda Europa deixaram suas casas para chegar, após viagens longas e perigosas, às escolas da França onde o mestre ensinava. Como escreveu o grande filósofo francês Etienne Gilson: “Abelardo estabeleceu um padrão intelectual abaixo do qual não se aceitará nunca mais descer”. Espírito lúcido e coração generoso, homem e professor dominado pela paixão. Amou e foi amado por uma mulher, Heloísa, cujo destino mais tarde foi ser intelectual e depois abadessa, estando entrelaçado até o fim à vida de seu antigo professor, depois esposo e mais tarde irmão na Igreja. Abelardo tornou-se monge após a sua história de paixão com Heloísa.
O encontro com outro grande homem de seu tempo, Bernardo de Claraval, alimentou séculos de lendas e boatos. Eram dois gigantes, que se enfrentaram, e Bernardo venceu o mestre Palatino, mas representavam duas faces de uma mesma moeda reluzente de sagacidade e santidade. Abelardo tinha razão ao dizer que para crer é preciso antes compreender. Abelardo e Bernardo possibilitaram à cultura europeia dar um enorme salto.
Fonte: ZENIT.org